A RESPONSABILIDADE SUBSIDIÁRIA DA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA PELOS DÉBITOS TRABALHISTAS DE SEUS CONTRATADOS

Por Jeison Maikel Kwitschal (OAB/SC 31.463) – Assessor Jurídico do Município de Mafra e advogado associado da Del Olmo & Advogados Associados

Quando o empregado de uma empresa contratada por ente da Administração Pública reclama suas verbas trabalhistas no âmbito da Justiça do Trabalho não é incomum que inclua na demanda o ente público que contratara o seu empregador, já que muitas vezes a contratualidade laboral ocorreu toda em relação ao ente público, como no caso de um empregado que trabalha para uma construtora na execução de uma única obra pública ou, ainda, um servente ou vigia que laborou todo o contrato de trabalho tendo a repartição pública como o seu local de trabalho.

O Tribunal Superior do Trabalho já decidiu de forma sumulada que Os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n.º 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada;” (Súmula TST nº 331).

O contraponto deste posicionamento jurisprudencial consta do §1º do art. 71 da Lei de Licitações e Contratos Administrativos (Lei 8.666/93) que diz que “o contratado é responsável pelos encargos trabalhistas, previdenciários, fiscais e comerciais resultantes da execução do contrato.” (caput) e que “a inadimplência do contratado, com referência aos encargos trabalhistas, fiscais e comerciais não transfere à Administração Pública a responsabilidade por seu pagamento, nem poderá onerar o objeto do contrato ou restringir a regularização e o uso das obras e edificações, inclusive perante o Registro de Imóveis.”

O confronto entre a súmula e a norma acima referidas levou o Supremo Tribunal Federal a decidir, em sede de ação declaratória de constitucionalidade (ADC 16 – 24/11/2010), que é constitucional o §1º do art. 71 da Lei 8.666/93, advertindo apenas que apenas a constatação da culpa “in vigilando” gera a responsabilidade do ente contratante, isto é, se for constatada a omissão culposa da Administração Pública em relação à fiscalização quanto ao cumprimento dos encargos sociais do contratado, aí o ente público responde pelas verbas trabalhistas reclamadas pelo empregado da empresa contratada.

Pacificado no STF, coube ao Tribunais Regionais do Trabalho acatar tal entendimento, o que também se dá com o Colendo Tribunal Catarinense, que ao encontro do entendimento já elencado vem entendendo que “os entes integrantes da Administração Pública direta e indireta respondem subsidiariamente, nas mesmas condições do item IV, caso evidenciada a sua conduta culposa no cumprimento das obrigações da Lei n. 8.666, de 21.06.1993, especialmente na fiscalização do cumprimento das obrigações contratuais e legais da prestadora de serviço como empregadora. A aludida responsabilidade não decorre de mero inadimplemento das obrigações trabalhistas assumidas pela empresa regularmente contratada” (RO 0003842-53.2013.5.12.0040, pub. 19/01/2015)”

Embora a dúvida principal tenha sido solucionada, persiste o dissenso jurisprudencial quanto a como constatar a culpa da Administração Pública na fiscalização de tais contratos, o que nos leva a concluir que o administrador público deve fazer interpretação sistemática e o quanto mais zelosa possível dos dispositivos da Lei 8.666/93 que tratam da habilitação de licitantes (arts. 27 e 51), formação dos contratos (arts. 54 e 55) e fiscalização do mesmo, pois “a execução do contrato deverá ser acompanhada e fiscalizada por um representante da Administração especialmente designado, permitida a contratação de terceiros para assisti-lo e subsidiá-lo de informações pertinentes a essa atribuição” (art. 67), sendo que “o representante da Administração anotará em registro próprio todas as ocorrências relacionadas com a execução do contrato, determinando o que for necessário à regularização das faltas ou defeitos observados” (art. 67, §1º), devendo “o contratado deverá manter preposto, aceito pela Administração, no local da obra ou serviço, para representá-lo na execução do contrato” (art. 68).

Resta claro que o procedimento licitatório não exonera a Administração Pública da culpa “in vigilando”, já que, incumbe ao ente público o dever de fiscalizar a execução do contrato junto a empresa vencedora. Contudo, “[…] havendo vedação legal e inexistindo nexo de causalidade entre o comportamento do gestor público e a lesão ao direito do trabalhador, incabível condenar subsidiariamente o ente da Administração Pública Direta ou Indireta ao pagamento das verbas laborais não satisfeitas pela empregadora contratada por meio de procedimento licitatório (RO 0008649-65.2012.5.12.0036, pub. 01/12/2014).”

Portanto, quando a Administração Pública intentar a contratação de empresa privada visando a execução de determinado serviço, deve ela, além de fazer constar no edital as garantias quanto ao adimplemento de verbas trabalhistas, deve se ater as normas legais do cumprimento contratual, primando por uma fiscalização efetiva do contrato, o que se dá através da indicação de fiscal hábil para tanto, bem como através de mecanismos de verificação corriqueira da documentação habilitatória durante a vigência do contrato, em especial, no ato de liquidação dos valores devidos, pois só assim estará a Administração Pública livre do ônus da responsabilização subsidiária de possíveis verbas trabalhistas não adimplidas pelas empresas contratadas em certame licitatório próprio.