MEDIDA PROVISÓRIA 936: NOVAS ALTERNATIVAS TRABALHISTAS DE AMPARO À CRISE COVID-19

MEDIDA PROVISÓRIA 936: NOVAS ALTERNATIVAS TRABALHISTAS DE AMPARO À CRISE COVID-19

Ansiosamente aguardada nos últimos dias, o Governo Federal editou nova Medida Provisória (MP) com medidas trabalhistas que poderão ser adotadas pelos empregadores para preservação do emprego e renda. Trata-se da Medida Provisória n. 936, de  de abril de 2020, que institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dá outras providências.

Assim como citamos anteriormente em nosso outro artigo (http://www.delolmo.com.br/medidas-juridicas-de-contencao-da-crise-covid-19-aspectos-trabalhistas/), é preciso que se tenha o correto entendimento e compreensão da norma, para que adequadamente seja aplicada, de acordo com o perfil de cada empresa/empreendimento. Sem pretensão acadêmica alguma e primando pela objetividade, vamos a elas:

Inicialmente, é preciso lembrar que a nova Medida Provisória (MP 936/2020) não substituiu a Medida Provisória 927, primeira norma editada com o objetivo de salvaguardar os empregos e renda em meio a crise que vivemos. São medidas que visam proporcionar às empresas alternativas para enfrentar a grave crise econômica instalada em razão da pandemia da Covid-19.

Em segundo lugar, muitos dos dispositivos que estão inseridos nestas normas (MP 927 e 936) são optativos, isto é, cabe exclusivamente ao empregador decidir se vai fazer o uso das medidas legais editadas pelo Governo Federal, dentro, evidentemente, das regras que ali foram colocadas.

Não há qualquer restrição de uso destas medidas a este ou aquele segmento econômico (a exceção de algumas ressalvas quanto a faixas de faturamento), mas não deveria se esperar, principalmente por uma questão de bom senso e razoabilidade, que aqueles setores produtivos que não foram impactados com a crise usem desses recursos para algo que literamente não precisam.

Em terceiro lugar, é preciso não deixar de ter em mente que as disposições previstas na Constituição Federal (obviamente) e na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) permanecem absolutamente válidas, com algumas ressalvas e flexibilizações em razão do momento, que é declaradamente de Força Maior (art. 501, CLT) e único, nunca vivido anteriormente na história do País e que mesmo nessa situação excepcionalíssima há de se seguir determinados preceitos legais, sobretudo aqueles que foram previstos nestas duas últimas Medidas Provisórias.

Dito isso, vamos às novidades anunciadas há pouco:

A nova MP 936 estabeleceu duas medidas (soluções) como remédio para salvaguarda de empregos e uma medida assistencial, isto é, criou um benefício diante dessas duas situações, chamado de Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda.

A primeira delas é a possibilidade de se estabelecer a redução da jornada de trabalho e salários. São as seguintes condições e características:

  • Somente valerá durante o estado de calamidade pública (ou seja, deve-se estar atento a duração oficial do decreto);
  • Poderá ser acordado por até 90 (noventa) dias;
  • Deve ser preservado o valor do salário-hora de trabalho;
  • O acordo poderá ser feito individualmente entre empregador e empregado, encaminhado a este último com dois dias de antecedência;
  • A redução da jornada de trabalho e de salário será exclusivamente nos seguintes percentuais: 25%, 50% e 70%;
  • O retorno a condição normal de trabalho que até então vigorava deverá ser reestabelecida em até dois dias após o fim do estado de calamidade pública ou do término do que foi estabelecido no acordo individual, ou mesmo na hipótese de antecipação do fim da redução de jornada;
  • O pagamento do Benefício Emergencial será devido a partir da data do início da redução da jornada de trabalho e de salário e a primeira parcela será paga no prazo de trinta dias, contado da data da celebração do respectivo acordo;
  • O Benefício Emergencial será pago exclusivamente enquanto durar a redução proporcional da jornada de trabalho e de salário;
  • O percentual de redução do salário será na mesma proporção da redução da jornada (25/50/70 por cento);
  • Portanto, há três tipos de redução de jornada e salário: Acima de 25% e abaixo de 50%, o valor será de 25% do seguro-desemprego. Com redução acima de 50% e abaixo de 70%, a parcela será de 50%, sendo de 70%, com o governo complementando 70% do seguro-desemprego;
  • Se a redução for de até 25%, não haverá complementação;
  • Não se trata o Benefício Emergencial de um “complemento integral” do salário faltante; Também não se trata de um Seguro Desemprego propriamente dito. O Benefício Emergencial é uma ajuda financeira neste período, tomando por base o cálculo do seguro desemprego e pagamento de parte dele. Ou seja, o salário habitual não será recebido integralmente, mesmo com a ajuda do Benefício Emergencial;
  • Por exemplo:
    Considerando um trabalhador que recebe 2 mil reais por mês, com carga horária de 44 horas semanais e; Considerando que foi feito um acordo para redução de 50% de jornada e salário, o cálculo será:
    R$ 2.000,00 (-) 50% = R$ 1.000,00 (a empresa paga)

A diferença será paga pelo Governo Federal, que calculará, nesse exemplo, 50% do valor do seguro desemprego que teria direito o empregado. Nesses valores, considerando que o seguro desemprego seria de aproximadamente R$ 1.480,00, o valor do beneficio será de R$ 740,00 (metade do valor do seguro desemprego).
Logo, nesse exemplo, o empregado receberá, com a redução de jornada e de salário, o valor de R$ 1.740,00.

A segunda medida trata da possibilidade da Suspensão Temporária do Contrato de Trabalho. Vamos às principais características:

  • Somente valerá durante o estado de calamidade pública (ou seja, deve-se estar atento a duração oficial do decreto);
  • Poderá ser usado por micro e pequenas empresas que faturam até 4,8 milhões de reais por ano;
  • Poderá ser acordado por até 60 (sessenta) dias, que poderá ser fracionado em até dois períodos de trinta dias. (p. ex, suspende 30 – retorno ao trabalho – suspende mais 30);
  • Durante o período de suspensão o empregado terá direito a todos os benefícios concedidos pelo empregador (p. ex, plano de saúde);
  • Durante o período de suspensão o empregado poderá recolher para o Regime Geral de Previdência Social na qualidade de segurado facultativo;
  • O retorno à condição normal de trabalho que até então vigorava deverá ser restabelecida em até dois dias após o fim do estado de calamidade pública ou do término do que foi estabelecido no acordo individual, ou mesmo na hipótese de antecipação do fim suspensão;
  • Se o empregado mantiver as atividades de trabalho, ainda que parcialmente, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou trabalho à distância, ficará descaracterizada a suspensão temporária do contrato de trabalho;
  • Quanto ao pagamento do Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda: Se micro ou pequena empresa (com faturamento anual de até 4,8 milhões), o Governo Federal irá bancar 100% do seguro-desemprego ao qual o trabalhador teria direito caso fosse demitido. Em se tratando de empresa com receita bruta superior a 4,8 milhões no ano de 2019, somente poderá suspender o contrato de trabalho de seus empregados mediante o pagamento de ajuda compensatória mensal no valor de 30% do valor do salário do empregado, com pagamento do restante pelo Governo Federal.

Por fim, vale destacar as condições gerais, entre outras observações, aplicáveis à ambas as medidas (redução e suspensão):

  • Compete ao Ministério da Economia coordenar, executar, monitorar e avaliar o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e editar normas complementares necessárias à sua execução, o que significa que a respectiva regulamentação das medidas (como a comunicação dos acordos, entre outros) será feita por atos normativos (portarias, instruções, resoluções) do Ministério da Economia, o que deverá ocorrer nos dias subsequentes a publicação da medida provisória.
  • É prudente e necessário que se aguarde a edição do regulamento, seja para conhecer a forma exata de transmissão de dados e informações ao Governo Federal (Ministério da Economia), seja para dar início ao(s) prazo(s) citados na MP 936 (vide, p. ex, definições do art. 5º), que devem ser rigorosamente seguidos;
  • Em princípio, o sistema de transmissão de todos os dados pertinentes serão feitos através da plataforma “Empregador Web”, que já é de amplo conhecimento do setor produtivo;
  • Não há possibilidade de ‘acordo com efeito retroativo’, até porque a MP 936 trata que as medidas (redução ou suspensão) deverão ser comunicadas ao empregado com dois dias corridos de antecedência;
  • O Benefício Emergencial não é um “complemento integral” do salário faltante; Também não se trata de um Seguro Desemprego propriamente dito. O Benefício Emergencial é uma ajuda financeira neste período de calamidade pública, tomando por base o cálculo do seguro desemprego e pagamento de parte dele. Ou seja, o salário habitual não será recebido integralmente, mesmo com a ajuda do Benefício Emergencial.
  • As negociações individuais (tanto para redução quanto a suspensão) valerão para os empregados que ganham até três salários mínimos (R$ 3.135) ou para o trabalhador de nível superior que receba igual ou mais de R$ 12.202,12, o dobro do teto da Previdência Social; Exceto essas hipóteses (entre 3.135 – 12.202,12, somente deverão ser estabelecidas por convenção ou acordo coletivo, ressalvada a redução de jornada de trabalho e de salário de vinte e cinco por cento);
  • O empregador poderá dispor de ajuda compensatória mensal, de natureza meramente indenizatória (não integrando a base de cálculo do salário), acumulando-se ao Benefício Emergencial. Ou seja, trata-se de uma faculdade do empregador, não um dever;
  • Segundo a MP 936, fica reconhecida a garantia provisória no emprego ao empregado que receber se sujeitar as medidas e o Benefício Emergencial, pelo tempo equivalente ao período acordado de redução da jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho e, após o término das medidas, por período equivalente ao acordado para a redução ou a suspensão. (p. ex, se a redução ou suspensão foi de 60 dias, nesse período o empregado gozará de garantia empregatícia e, quando encerrar as medidas, mais 60 dias dessa mesma garantia);
  • As medidas de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho tratadas na MP 936 também poderão ser celebradas por meio de negociação coletiva;
  • Os acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária do contrato de trabalho, pactuados nos termos desta Medida Provisória, deverão ser comunicados pelos empregadores ao respectivo sindicato laboral, no prazo de até dez dias corridos, contado da data de sua celebração
  • As disposições da MP 936 se aplicam aos contratos de trabalho de aprendizagem, de jornada parcial e aqueles que se encontram em período de experiência;

Como era de se esperar, críticas já surgem, como aqueles que sustentam que a redução de jornada e de salário seria inconstitucional, assim como já brotam ameaças veladas de entidades sindicais quanto à aplicação dessas normas, esquecendo os críticos, respeitosamente, que estamos vivendo um momento único e que não são apenas os empregados os prejudicados. Esquecem-se, dentre tanto a considerar, que a Medida Provisória 936 (assim como a MP 927) é editada num contexto reconhecidamente de Força Maior. Como o próprio nome diz, a MP 936 trata do Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública e urgência médica de caráter internacional.

Se de um lado paira o princípio constitucional da irredutibilidade salarial, de outro, de mesma base normativa, ainda vigora o objetivo da construção de uma sociedade livre, justa e solidária, da garantia do desenvolvimento social, da erradicação da pobreza, a promoção do bem estar de todos, da busca do pleno emprego (…). Numa linha, vale dizer, não há emprego sem um empregador. Não há aumento ou diminuição de salário, em qualquer contexto, se o posto de trabalho deixar de existir e é por estes milhares de postos de trabalho que a Medida Provisória 927 e 936 foi editada como alternativa para minimizar o desemprego que já se anuncia e o enfrentamento da crise econômica que tem se alastrado muito mais rapidamente que o famigerado ‘coronavírus’. Precipitadas discussões e ameaças não contribuem em nada com a situação e somente vão de encontro ao esforço para manutenção e preservação de milhares de empregos e tudo aquilo que este sagrado instituto arrasta consigo.

Por Sergio Ricardo da Cunha Ramos (OAB/SC 34.295) – Advogado Titular da Del Olmo & Advogados Associados.