O ITBI Devido por Empresa do Ramo Imobiliário na Integralização de Capital com Imóvel

Por Jeison Maikel Kwitschal (OAB/SC 31.463) – Assessor Jurídico do Município de Campo Alegre e integrante da Del Olmo & Advogados Associados

A Constituição Federal traz, em seu art. 156, inciso II, a competência municipal para instituir o Imposto de Transmissão Inter Vivos, também conhecido por ITBI, fixando como fato gerador a “transmissão inter vivos, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição”.

“O sujeito passivo do ITBI é o comprador” (STJ, (REsp 362.375/SP), logo, quando um imóvel é vendido (ou transferido de outro forma onerosa), realiza-se o fato gerador deste tributo, nascendo a obrigação para o comprador do imóvel.

Um exceção a esta regra é a imunidade tributária referida no §2º, inciso I, do art. 156 da Constituição Federal, que diz que “não incide sobre a transmissão de bens imóveis ou direitos, quando realizada para incorporação ao patrimônio de pessoa jurídica em pagamento de capital nela subscrito”. Esta transmissão pode ser feita inclusive por instrumento particular, no próprio contrato social da empresa que pretende fazer a integralização do capital, desde que cumpridas as regras da Lei de Registros Públicos (Lei 8.934/94, art. 35, VII), dispensando a escritura pública.

Portanto, uma vez subscrito o capital de uma sociedade, pode o mesmo ser integralizado pelo sócio através da transmissão de um bem imóvel à empresa, sem que isto caracterize a hipótese de incidência do ITBI, salvo se “a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil” (CF, art. 156, §º, I).

Trata-se de uma condição que afasta a imunidade tributária, de modo que se a empresa que adquire o imóvel integralizado tiver atividade preponderantemente imobiliária, não poderá invocar a imunidade e, neste caso, incide o tributo.

Exemplificando, se o sócio de uma indústria transfere para a mesma um imóvel de sua propriedade para integralizar capital subscrito, estamos diante da hipótese de não incidência e, por outro lado, se o sócio de uma imobiliária fizer a mesma operação, aí é devido o tributo.

A questão parece simples, mas o complicador aparece quando é preciso definir quando uma empresa tem atividade preponderantemente imobiliária. Diz o §1º do art. 37 do Código Tributário Nacional que se considera caracterizada a atividade preponderante “quando mais de 50% da receita operacional da pessoa jurídica adquirente, nos 2 (dois) anos anteriores e nos 2 (dois) anos subsequentes à aquisição, decorrer de transações” imobiliárias.

Ora, o dispositivo estabelece uma condição de verificação da imunidade tributária que se inicia dois anos antes da operação e termina dois anos após, dificultando por demais a verificação, no momento da alienação do imóvel, se o imposto é devido ou não.

Imagine o caso de uma empresa nova que recebe a integralização de capital pela transferência imobiliária efetuada por um sócio e só inicia suas atividades um ano após. Como medir a receita operacional “nos 2 (dois) anos anteriores” à transação?

Para resolver esta questão o legislador acresceu mais um parágrafo ao art. 37 do CTN (§2º), que diz que “se a pessoa jurídica adquirente iniciar suas atividades após a aquisição, ou menos de 2 (dois) anos antes dela, apurar-se-á a preponderância referida no parágrafo anterior, levando em conta os 3 (três) primeiros anos seguintes à data da aquisição”. Ainda assim o dispositivo impõe o decurso de três anos após a aquisição para que reste definido se o imposto é devido ou não.

A insegurança jurídica quanto à incidência do ITBI ou a sua imunidade, nos casos de integralização de capital pela transferência imobiliária, tem levado os contribuintes e o Fisco ao Poder Judiciário, especialmente para discutir a legitimidade na repetição do indébito, ou seja, quem pode cobrar a devolução do ITBI cobrado (e recolhido) indevidamente.

O Tribunal de Justiça de Santa Catarina enfrentou o caso e pacificou o entendimento de que “ausente a prova de que a atividade preponderante da empresa não advém da administração e da compra e venda de imóveis, torna-se desnecessário aguardar o prazo de três anos previsto no art. 37, § 2º, do CTN, que se dirige aos casos em que a referida atividade preponderante não se encontra descrita no contrato social e há dúvida sobre o exercício dela” (TJSC, AI n. 2012.070541-3, de Balneário Camboriú, rel. Des. JAIME RAMOS, j. em 28/02/2013).

Portanto, para a Corte Catarinense o ideal é que o contrato social da empresa que pretende integralizar capital com imóvel diga, de antemão, na cláusula do objeto social, se a atividade imobiliária é ou não é a atividade preponderante da empresa. Se isto estiver claro, aí é devido o tributo. Por outro lado, se a atividade preponderante não estiver descrita adequadamente no contrato social (o que por si é absurdo) e se por isso houver fundada dúvida quanto ao seu exercício, aí sim é caso de aplicar-se a regra do §2º do art. 37 do CTN, postergando em até três anos após a transmissão imobiliária o momento em que restará definido se o ITBI é devido ou não.

Na visão do eminente Desembargador JAIME RAMOS, relator do paradigma, é o contribuinte que se beneficiará com a imunidade que precisa estar munido da prova de que a atividade preponderante de sua empresa não é imobiliária. Não demonstrada esta condição pelo contribuinte, não é preciso que o Fisco Municipal aguarde o interstício de três anos referido no §2º do art. 37 do CTN, podendo lançar o ITBI em face da empresa adquirente desde logo.

É comum que investidores em imóveis constituam empresas com objeto social inespecífico, justamente para que possam negociar imóveis sem a incidência do ITBI na aquisição dos mesmos. O que espera este investidor é que o imóvel que antes foi transferido à empresa por integralização de capital, sem o recolhimento de ITBI, possa ser vendido ao novo adquirente sem chamar a atenção do Fisco Municipal, caso em que a prescrição quinquenal passará a alcançar a operação tributável.

Não se faz censura alguma ao particular neste ponto. É a lei que permite ao particular transferir o imóvel em integralização por escritura particular e sem comunicar o Fisco Municipal, salvo quando esta obrigação é especificamente prevista na legislação municipal.

Concluindo, é lícito ao Fisco Municipal cobrar o ITBI de empresas que recebem imóveis transferidos por sócios em operações de integralizações de capital, salvo se a empresa comprovar, no momento da operação, a condição que afasta o foco tributante, qual seja, a de que não exercer preponderantemente a atividade imobiliária.