A EXIGÊNCIA DE REGULARIDADE FISCAL DE MICROEMPRESA EM PREGÕES

Por Manolo Del Olmo (OAB/SC 13.976) – Advogado Titular da Del Olmo & Advogados Associados

Ocorre com certa frequência em pregões presenciais a inabilitação de licitantes microempresas, isto em decorrência da falta de Certidão Conjunta Negativa de Débitos Relativos aos Tributos Federais e à Dívida Ativa da União, emitida pela Receita Federal.

Penso que muitas destas inabilitações são indevidas, já que o Pregoeiro só pode exigir a prova da regularidade “para efeito de assinatura do contrato”, como quer o art. 42 da Lei Complementar n. 123/06. O disposto no referido artigo veda a exigência da CND para efeito de licitação, o que significa que a microempresa pode participar do certame estando em débito com o fisco e ainda assim não ser inabilitada.

Não se diga que a microempresa está obrigada a comprovar, na entrega da documentação de habilitação, a sua condição de débito (com certidão positiva ou certidão negativa vencida) em razão do art. 43 da mesma lei dizer que o licitante deverá “apresentar toda a documentação exigida para efeito de comprovação de regularidade fiscal, mesmo que esta apresente alguma restrição”, e isto por dois motivos.

Em primeiro lugar porque tal interpretação conduz ao absurdo e é regra hermenêutica básica que o exegeta não interpreta a norma no sentido do absurdo. Digo que a tal interpretação seria absurda porque se a microempresa pode participar do certame sem comprovar a regularidade é porque ela pode participar possuindo débitos, logo, se a empresa não apresenta a CND é presumível que isto se deva à débitos havidos, pois por qual outro motivo a empresa deixaria de juntar a CND e requerer, em cinco dias, o prazo para regularização?

Se a empresa detém regularidade ela apresenta a CND ou a CPD com efeito de negativa, mas, se não apresenta estas certidões é porque está em débito. Seria absurdo exigir que a microempresa comprove que está em débito como condição para, no momento seguinte, exercer o direito de regularização fiscal em cinco dias.

Em segundo lugar, quando está em questão a Certidão Conjunta Negativa de Débitos Relativos aos Tributos Federais e à Dívida Ativa da União é preciso levar em conta que a obtenção da CND se dá de forma online, mas quando há débitos não parcelados a CPD (Certidão Positiva de Débito), ela só pode ser obtida pelo licitante com requerimento pessoal e feito com antecedência numa unidade da RFB, como consta de informação veiculada no site da Receita Federal:

Certidão Positiva de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CPD)

Poderá ser fornecida Certidão Positiva de Débitos relativos a Créditos Tributários Federais e à Dívida Ativa da União (CPD), que conterá relação resumida de pendências do sujeito passivo:

1. perante a RFB, relativas a débitos, a dados cadastrais e à apresentação de declarações;

2. perante a PGFN, relativas a inscrições em cobrança;

A Certidão Positiva somente será emitida, exclusivamente, pelas unidades da RFB.

Logo, se uma microempresa tem débitos, ela entrará no site de emissão da certidão conjunta e, uma vez digitado o CNPJ, a mensagem veiculada será “As informações disponíveis na Secretaria da Receita Federal do Brasil – RFB e na Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional – PGFN sobre o contribuinte xxxxxxxxx são insuficientes para a emissão de certidão por meio da Internet”, ou seja, a microempresa devedora não pode obter a CPD no site, só pessoalmente.

Não se diga que por isso a microempresa deve comparecer dias antes numa unidade da RFB e lá obter uma CPD, pois tal entendimento subverte completamente o “tratamento diferenciado” contido na referida LC 123/06 e, antes, aquele estabelecido no art. 179 da CF/88.

Se as microempresas em débito precisam se submeter a uma dificuldade não extensível às demais para se habilitar do ponto de vista fiscal, então o tal “tratamento diferenciado” é só uma miragem.

Não se pode, com espertezas, invalidar o intento do legislador. O que impõe os artigos 42 e seguintes da LC 123/06 é tratamento preferente à microempresa, de modo que se ela tem a CND, ótimo, se não tem, é imprescindível a concessão do prazo de 05 dias para que a microempresa busque a regularização e a comprove ao órgão licitante, nos termos do §1º do art. 43 da citada lei, que diz “havendo alguma restrição na comprovação da regularidade fiscal, será assegurado o prazo de 5 (cinco) dias úteis, cujo termo inicial corresponderá ao momento em que o proponente for declarado o vencedor do certame, prorrogável por igual período, a critério da administração pública, para a regularização da documentação, pagamento ou parcelamento do débito e emissão de eventuais certidões negativas ou positivas com efeito de certidão negativa

O contrário disso viola o direito a tratamento diferenciado, ensejando a concessão de segurança mandamental, como se vê do precedente do tribunal gaúcho: “Não tendo sido oportunizado o prazo previsto no art. 43, § 1º, da LC 123/06 para comprovação da regularidade fiscal, resta configurada a ilegalidade perpetrada pela Comissão de Pregão ao considerar a impetrante, empresa de pequeno porte inabilitada, violando-lhe direito líquido e certo, merecendo ser mantida, portanto, a sentença que concedeu a ordem” (TJRS – Apelação e Reexame Necessário Nº 70061404646, 22ª Câmara Cível, J. em 25/09/2014).